Nascente: talhão 276 (39° 44.716’N · 8° 58.500’W)

Foz: talhão 251 (39° 46.486’N · 9° 01.413’W)

Comprimento: 6350 metros

Tributários: Ribeira da Lagoa das Éguas, Ribeira do Brejo d’Água, Ribeira do Tremelgo, Ribeira do Rio Tinto, Ribeira da Guarda Nova (ou Ribeira do Tecelão)

A Ribeira de São Pedro resulta da confluência da Ribeira da Lagoa das Éguas com a Ribeira do Rio Tinto, junto à ponte na estrada para São Pedro de Moel. Deste ponto para jusante, uma série de pequenas nascentes, ora numa margem ora noutra, vão alimentando a ribeira. Ao longo dos seus 6 km, vai-se desenvolvendo num vale progressivamente mais encaixado até desaguar no Canto do Ribeiro.

Este é o único curso de água permanente em todo o Pinhal do Rei. De um modo geral os seus tributários costumam secar, pelo menos parcialmente, durante o verão.

O Vale da Ribeira de São Pedro é, porventura, o mais interessante acidente geológico em todo o Pinhal do Rei. Ao longo do tempo a ribeira modelou a paisagem, erodindo as dunas até fazer aflorar os calcários do período Jurássico, onde assenta o seu leito.

A vegetação luxuriante que envolve todo o vale, representa a antítese de tudo quanto sabemos sobre introdução de espécies exóticas. Estamos perante um coberto vegetal maioritariamente não indígena, com inúmeras espécies reconhecidamente invasoras (acácias, eucaliptos) a dominarem a paisagem. E, no entanto, poderíamos estar diante de um bosque saído de um conto de fadas. A perfeição com que estas árvores se enquadram no meio e o singular equilíbrio entre diferentes espécies, sem que nenhuma delas evidencie um comportamento marcadamente invasivo, poderiam ser um caso de estudo.

Situada na extremidade norte da bacia hidrográfica das ribeiras do oeste, a Ribeira de São Pedro é, a vários níveis, um caso de exceção entre os restantes cursos de água que compõem esta bacia hidrográfica:

  • não sofre a pressão urbanística associada a tantos outros cursos de água litorais,
  • não existem terrenos agrícolas nas imediações (com a inevitável contaminação por pesticidas),
  • não existe captação de água para consumo humano ou animal,
  • não existem descargas de águas residuais de pecuárias ou industrias.

A qualidade da água aparenta ser, no geral, bastante satisfatória, e muito boa se comparada com a generalidade das ribeiras desta bacia hidrográfica. A Ribeira de São Pedro revela-se, assim, como um testemunho vivo da ecologia das primitivas ribeiras do oeste.

Isto traduz-se numa riqueza faunística singular que deve ser estudada, divulgada e protegida. Destaca-se, como exemplo, a ocorrência de:

  • Lontra-europeia (Lutra lutra). Embora o Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal lhe atribua um estatuto de conservação de Pouco Preocupante, existe um decréscimo acentuado dos efetivos populacionais em toda a Europa, o que levou a IUCN a atribuir-lhe um estatuto de Quase Ameaçada. De um ponto de vista legal, a espécie encontra-se protegida pela diretiva Habitats, pela Convenção de Berna e CITES.
  • Rã-ibérica (Rana iberica). A rã-ibérica é um endemismo peninsular com estatuto de conservação Quase Ameaçada. A população presente na Ribeira corresponde ao limite costeiro sul de distribuição da espécie, encontrando-se isolada da sua área de distribuição principal. Este factor inviabiliza a repovoação natural da espécie, tornando a população local extremamente vulnerável a quaisquer alterações no seu habitat.
  • Enguia (Anguilla anguilla). Classificada com um estatuto de conservação de Criticamente em Perigo pelo IUCN e de Em Perigo pelo Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal.
  • Lampreia-de-riacho (Lampetra planeri). No caso da lampreia-de-riacho, o estatuto de conservação inverte-se, atribuindo-lhe a IUCN uma classificação de Pouco Preocupante enquanto o Livro Vermelho a classifica como Criticamente em Perigo.
  • Ruivaco (Achondrostoma oligolepis). A conhecimento sobre a distribuição da espécie é escasso, mas sabemos que se restringe ao nosso país estando ameaçada pela poluição e alteração das linhas de água.

Tributários

Ribeira da Lagoa das Éguas

A Ribeira da Lagoa das Éguas é o principal tributário da Ribeira de São Pedro. Nasce na Burinhosa, a sul do Pinhal do Rei e corre para norte, ao longo do Pinhal, até se juntar à Ribeira do Rio Tinto, passando então a designar-se Ribeira de São Pedro. Tem como afluentes a Ribeira do Brejo d’Água e a Ribeira do Tremelgo.

Ribeira do Rio Tinto

A Ribeira do Rio Tinto nasce na Moita e corre para noroeste até se juntar à Ribeira da Lagoa das Éguas. Tem como afluente a Ribeira da Guarda Nova.

Histórias da Ribeira de São Pedro

A barragem de D. Fernando

De acordo com Arala Pinto, aquando da abertura da estrada que ladeia a Ribeira, ter-se-ão encontrado as ruínas de uma antiga barragem: “Próximo da foz daquele ribeiro, quando do estudo, em 1930, para a construção do caminho florestal que hoje em parte o margina, então verdadeira mata virgem, fui encontrar os alicerces duma antiquíssima barragem de que ninguém me sabia dar notícia. Só o estudo da sua argamassa nos poderia subministrar conhecimentos sôbre a idade aproximada da sua construção.

A investigação de Arala Pinto levou-o a concluir que a barragem seria do tempo de D. Fernando (século XIV) e que teria sido construída de forma a permitir o transporte da madeira do interior da Mata até à foz e, daí, para qualquer parte do reino. Esta conclusão fundamenta-se, em parte, num documento deste monarca, isentando os pescadores da Pederneira do pagamento de um imposto porque “serviam em cada hûm dia nas nossas armadas. E no nosso baleall datouguia. E outrosy em carretar a nossa madeira que vem do nosso pinhal de leiria pollagoa ao traves“.

Lamentavelmente, o conhecimento relativo à localização das ruínas da barragem voltou a perder-se com o tempo. A vegetação, uma vez mais, terá ocultado este segredo do Pinhal do Rei.

O incêndio de 2017 e o futuro da Ribeira

O grande incêndio de outubro de 2017 afetou de forma dramática os principais tributários da Ribeira de São Pedro, assim como cerca de 2/3 do seu curso, até à zona da Ponte Nova. O vale, agora despido de qualquer vegetação, está sujeito a um acelerado processo de erosão. As acácias, espécie pirófita, até aqui controladas pelo ensombramento do local começaram a germinar de forma descontrolada.

As medidas tomadas pelas autoridades competentes, pecam por tardias, manifestamente insuficientes e inconsequentes. A manter-se o desinteresse daqueles que deviam zelar pela proteção deste espaço e a gritante falta de meios da gestão local, a Ribeira de São Pedro e o seu vale encantando perder-se-ão para sempre.

Texto e cartografia: CF. Fotografia: RM, AM, CF.