Desde tempos remotos que o Pinhal do Rei, também designado por Pinhal de Leiria, forneceu à construção naval produtos como: pez, pixe (pez negro), alcatrão (pez líquido) e breu (pez cozido e seco), obtidos a partir das achas resinosas dos pinheiros.
Inicialmente, estes produtos usavam-se na calafetagem dos barcos e nas abordagens por embarcações inimigas, onde, depois de inflamado e a ferver, era derramado como material de destruição.
Mais tarde, as águas-razes e águas-ruças produzidas nas mesmas fábricas, por destilação das achas resinosas, passaram a usar-se nas indústrias dos vernizes, tintas lacadas, sabões, tinturaria, farmacêutica e perfumaria.
A respeito deste tipo de exploração, a maioria dos autores indica, como referência mais antiga, a existência, em 1475, no lugar hoje conhecido como Engenho, de uma pequena e muito rudimentar fábrica destas substâncias, propriedade de Pedro de Menezes, Conde de Vila Real, que, desde 1463, feito donatário de Leiria, incluía entre os seus direitos e rendas o “Ramo das Rendas do Pez”.
Em 1507, acerca destes primitivos fornos, designados por “fornos de pixe”, e da forma como em qualquer lado eram montados, Fernando de Oliveira, no “Livro da Fábrica das Naus”, dizia:
“Tira-se o breu de certas árvores; as quais todas são espécies de pinho, das quaes há munta copia dellas em Alemanha, e terras do norte. Partê o pao destas arvores em achas, e poênas arrimadas hûas e outras sobre hûa cova, a maneyra de forno de cal, ou de carvão, e pondo-lhe o fogo escorre o pez na cova. Em algûas partes esta cova he fornalha de paredes, e o fundo della he hûa caldeira de metal, cuberta com hum rabo de ferro, por não cair nella o carvão das achas queymadas (…)”.
Outra referência aos fornos do pez, no, agora, lugar do Engenho, aparece, em 1597, na 1ª Demarcação do Pinhal de Leiria, e que, o Eng.º Arala Pinto, historiador e chefe da Circunscrição Florestal Marinhense, transcreve, em 1938, no seu livro O Pinhal do Rei: “(…) e este do dicto marco deviza pelo brejo acima ao lugar da Garcia por cima das serradas de Alvaro Pires, e de Braz Pires que ora estão rotas, e dahi em diante pelo brejo acima ao longo do Rapadouro (pequeno lugar ainda hoje existente) direito aos fornos do Pez, (Engenho) e dahi pela estrada direita à Lagoa da Sapinha (…)”.
Estes documentos atestam a importância que esta actividade teria adquirido até essa época na zona do Pinhal do Rei.
Em 1751, o Regimento para o Guarda Mor dos Pinhais de Leiria, do Marquês de Pombal, referia-se ao fabrico destas substâncias estabelecendo um conjunto de regras para a exploração e segurança dos fornos do pez, dizendo no parágrafo 16: “Mando que nenhuma pessoa de qualquer qualidade, que seja, possa ter fornos de pez, duas legoas em redondo dos meus Pinhaes, excepto aquellas pessoas, a quem for rematado o mesmo pez; as quaes hão de observar as condições, que se apontão no Regimento do Superintendente da Fábrica da Madeira da Marinha (…)”.
A partir de 1780, no reinado de D. Maria I, esta indústria teve grande desenvolvimento.
Por volta de 1790, para desenvolvimento do fabrico de alcatrão no Pinhal do Rei, o Ministro da Marinha Martinho de Mello e Castro mandou vir de Ragusa um técnico na fabricação deste produto, ficando os novos fornos construídos para esse fim conhecidos como ragusanos.
Embora com novos métodos e novo tipo de fornos, continuou-se ainda assim a usar os antigos fornos de pixe, sendo noticiado, em 1815, nas “Memórias Económicas da Academia Real das Ciências de Lisboa”, tomo V, das quais faz parte a “Memória sobre a descrição física e económica do lugar da Marinha Grande e suas vizinhanças pertencente ao Bispado de Leiria”, do Visconde de Balsemão, que o processo de produção dos produtos destas fábricas era ainda muito idêntico ao descrito por Fernando de Oliveira em 1507 no “Livro da Fábrica das Naus”.
Com o novo Regulamento para o Pinhal de Leiria, em 1790, vamos já encontrar o Estado como proprietário da Fábrica Resinosa, chamando a si a produção de pez e outros produtos de base resinosa, até aí entregues maioritariamente a particulares. Desta forma, o Estado aproveitava, devido à grande procura destes produtos, os grandes lucros desta indústria, evitando, por outro lado, os ajustes abusivos praticados por particulares aquando do fornecimento destes produtos ao Estado.
Texto: JMG. Fotografia: DF