A importância destes lugares no desenvolvimento industrial da Marinha Grande a partir do Séc. XVIII

Antes da indústria vidreira se ter instalado na Marinha Grande já a exploração florestal do Pinhal Real levara a que, nos lugares conhecidos hoje como Pedreanes e Engenho, situados na orla Este do Pinhal a cerca de 2 Km a norte da Marinha Grande, a partir do início do séc. XVIII, existisse um enorme pólo de desenvolvimento industrial, nomeadamente, após 1723, com a instalação da Fábrica da Madeira e o célebre engenho de serrar movido a vento, embora haja notícia, desde o séc. XV, de por ali haver os primitivos fornos do pez.

Pedreanes, a que teremos de juntar, pela sua interligação e proximidade, o lugar do Engenho, era de tal maneira importante ao nível da exploração florestal que, quando por volta de 1790 foi fechado o Pinhal, circundado pela “Grande Vala Geral”, e se deixaram apenas quatro passagens para entradas e saídas da Mata, controladas por Guardas que passaram a viver em casas construídas para o efeito nesses locais, ali haveria de ser construída uma das primeiras quatro casas de guarda.

Pedreanes

Entrada do Pinhal do Rei em Pedreanes

Do Engenho e Pedreanes saiu muita madeira para construção naval, construção civil e obras públicas, e também para travessas com que se assentaram linhas férreas, postes para linhas de telégrafo, telefone e eletricidade, e estacas para construção de portos e minas, tanto para Portugal como para o estrangeiro. Para tal foram construídas infraestruturas para dar capacidade de resposta às várias solicitações.

O lugar de Pedreanes tornar-se-ia tão importante ao nível industrial que, em meados do século XIX, por iniciativa de entidades privadas, ali foi instalado um Alto-forno, nascendo assim um grande projeto siderúrgico a escassos metros do Pinhal Real. Inicialmente com expectativas muito elevadas acerca do seu desempenho, este projeto viria em poucos anos a revelar-se ruinoso, dele restando hoje muito poucos vestígios.

Mais tarde, com a instalação das tercenas e a entrada ao serviço do caminho-de-ferro americano para escoamento dos produtos do Pinhal, Pedreanes haveria de conquistar ainda mais destaque.

Muitas das atividades acabariam por ter uma vida efémera mas, já no séc. XX, com a entrada em funcionamento do caminho-de-ferro florestal (Comboio de Lata), ligando Pedreanes à estação da Marinha Grande da Linha de Caminho-de-ferro do Oeste, por onde passaram a ser escoados os produtos do Pinhal, e com a construção da serração dos Serviços Florestais, oficinas de manutenção automóvel e do material circulante do Comboio de Lata, novos armazéns e dos bairros florestais que vieram acomodar guardas e mestres florestais e muito do pessoal especializado, Pedreanes haveria de voltar a ter novo destaque.

Pedreanes e o escoamento de produtos do Pinhal do Rei

Em 1824, Pedreanes era já um lugar de grande importância no que respeitava à exploração florestal do Pinhal do Rei, mas viria a aumentar essa importância na sequência das decisões tomadas após o grande incêndio que, nesse mesmo ano, destruiu uma imensa área florestal à volta de S. Pedro de Moel, prejudicando as atividades do embarcadouro onde eram feitos os embarques de madeira e outros produtos do Pinhal. Esta situação, juntamente com os constantes desgastes provocados pelo avanço do mar, levaram D. João VI a determinar que o embarque de madeiras do Pinhal Real se fizesse na foz do rio Lis.

Para apoiar os embarques na foz do Lis foram construídas tercenas (armazéns) naquele lugar e as Tercenas de S. Pedro de Moel foram, em 1871, mudadas para Pedreanes.

Entretanto, dada a localização estratégica de Pedreanes, ali foi centralizada a chegada dos produtos do Pinhal, trazidos pelos carreiros em carros de tração animal e posteriormente transportados para embarque na foz do Lis através do Caminho das Tábuas, assim chamado por aí se transportarem tábuas. Este caminho existiu desde 1840 e destinava-se a facilitar o trajeto entre Pedreanes e as Tercenas, na foz do rio Lis. Foi mais tarde melhorado, passando a ser constituído por varas de madeira dispostas longitudinalmente e assentes em estacas enterradas no solo, formando uma espécie de linha de caminho-de-ferro onde circulavam grandes carros puxados por bois e com cavas nas rodas para não descarrilarem. Por ser constituído por varas, passou a chamar-se Caminho das Varas.

Por volta de 1857, o embarcadouro de S. Martinho do Porto voltou a ter grande importância para o escoamento dos produtos do Pinhal do Rei e, mais uma vez, a partir de Pedreanes, se construiu um novo caminho para facilitar o transporte entre estes dois locais. Tratou-se de mais um caminho com tracção animal, ficando conhecido por Caminho de Ferro Americano. Foi construído inicialmente com carris de madeira mas, em 1861, com a renovação ordenada pelo Ministro das Obras Públicas, o Duque de Loulé, estes foram substituídos por carris de ferro, importados juntamente com material rolante, o que permitiu um melhor deslize.

Antiga estação do Caminho de Ferro Americano

Antiga estação do Caminho de Ferro Americano em Pedreanes

Em 1885, com o início da construção da Linha de Caminho-de-Ferro do Oeste, que aproveitou grande parte do traçado do Caminho de Ferro Americano, e com a chegada dos comboios a vapor à Marinha Grande em 1888, o Comboio Americano foi desativado.

O escoamento dos produtos do Pinhal do Rei passou a fazer-se pela Linha de Caminho-de-Ferro do Oeste, sendo construída em 1888/89 a Estrada da Estação (atual Av. 1º de Maio) que dava continuidade à Estrada do Engenho que, em 1867, foi a primeira estrada construída pelos Serviços Florestais, ligando o edifício da Administração a Pedreanes (atual Av. José Gregório), ficando assim feita a ligação entre Pedreanes e a estação dos caminhos-de-ferro.

Mas o transporte por tração animal era muito moroso, e com a introdução, em 1923, de um pequeno comboio a vapor de via reduzida (60 cm) no Pinhal do Rei, novamente se construiu um caminho específico para fazer o escoamento dos produtos do Pinhal, fazendo-se a ligação por caminho-de-ferro entre Pedreanes e a estação de caminho-de-ferro da Marinha Grande.

Locomotiva do Comboio de Lata na Guarda Nova

Locomotiva do Comboio de Lata na Guarda Nova – ano de 1963

Em 1965, com a rede de estradas bastante melhorada e já com bons transportes rodoviários, o comboio foi desativado e deixou de circular, passando esta ligação a fazer-se por via rodoviária.

Para os carreiros que do Pinhal retiravam produtos na zona de Pedreanes, quer fossem para uso próprio, quer fossem para venda, quer fossem pagos ou gratuitos, a saída do Pinhal implicava a passagem junto à Casa de Guarda, onde se encontrava a tranqueira e onde era feito o controlo das carradas pelos guardas-florestais, não fossem os carreiros levar escondido na carrada algo não autorizado.

Recorde-se que o Pinhal estava, desde os tempos do Marquês de Pombal, rodeado pela Grande Vala, precisamente para obrigar à circulação por locais estratégicos junto das Casas de Guarda e tranqueiras, estabelecidas em 1857 pelo Administrador José de Melo Gouveia para melhor ser feito o controlo de tudo o que entrava e saia do Pinhal.

Texto: JMG. Fotos: JMG & Arquivo